domingo, 21 de fevereiro de 2016

83 - A idealização do Estado autoritário e interventor no Brasil

A IDEALIZAÇÃO DO ESTADO AUTORITÁRIO E INTERVENTOR NO BRASIL

No dia 10 de janeiro de 2016, o sociólogo Jessé Souza publicou na Folha de São Paulo um artigo criticando o discurso antiestatista dos liberais brasileiros. No dia 31 daquele mês, o cientista político Marcos André Melo rebateu Jessé Souza em um artigo também publicado pela Folha. Em outro artigo no mesmo jornal, no dia 21 de fevereiro, Jessé Souza defendeu o seu primeiro texto e refutou as ideias de Marcos André Melo. Segue abaixo o texto de Marcos André Melo. Os argumentos de Jessé Souza não são convincentes e estão nos links no final da postagem.

Instigante debate tem sido gerado pela assertiva de Jessé Souza, na "Ilustríssima" (10/1), de que o Estado tem sido, no Brasil, "demonizado como corrupto e ineficiente e o mercado visto como o reino de todas as virtudes". Na realidade, as raízes do Brasil político e institucional passam longe de Sérgio Buarque de Holanda: elas se assentam em solo diverso, na santificação do Estado.

As instituições políticas brasileiras foram moldadas por essa visão iliberal. Ela foi o princípio organizador da ordem social de acesso limitado, para usar o conceito de Douglass C. North e coautores, que caracteriza o Brasil do século 20.

O Brasil monárquico, centralizador e escravagista do século 19 é por excelência o Brasil "Saquarema". Esse Brasil é produto da imaginação política do Visconde do Uruguai e dos líderes do Regresso Conservador: eles que forjaram as instituições fundamentais do país. Como lembra José Murilo de Carvalho, Uruguai é o pai do projeto conservador vitorioso que aposta na intervenção autoritária do Estado para redimir a nação e que marcou o Brasil do século 20.

Esse projeto se assenta no pressuposto de que a sociedade civil e o mercado são viciosos –faccionais, particularistas, locais– e de que o Estado é o ator fundamental nesse reformismo "pelo alto". O Estado demiurgo garantiria a integridade da ordem territorial e social.

Os discípulos diretos dessa visão no século 20 são Alberto Torres e Oliveira Vianna. Ao referir-se ao Brasil "invertebrado" criado pela República, Torres postulava um Estado forte que domasse os interesses privados regionais e patrocinasse o interesse coletivo. Em "Organização Nacional" (1910), Torres apresentou um projeto de reforma constitucional nacionalista e centralizador –e forneceu parte considerável do léxico iliberal que dominou o discurso político no século 20. Nessa chave, as instituições políticas liberais eram consideradas pouco propícias para prosperar no solo brasileiro. Vem de Torres e de pequeno círculo de publicistas com quem mantinha afinidades eletivas a fantasia do espelho de Próspero: a noção de que a democracia era coisa alienígena porque anglo-saxônica.

O nosso "Ocidente" seria outro: Ibérico. Iberismo e democracia, autogoverno, ou governo limitado, seriam incompatíveis. Vem também desse círculo de publicistas o horror aos partidos políticos e à competição política. O "locus" da política eram os Estados –todos os partidos eram estaduais–, daí o horror à federação. Quando finalmente escreveram uma constituição –para um Estado Novo em folha–, celebraram-na com uma tenebrosa queima de bandeiras estaduais.

Torres também forneceu a chave para a fórmula da disjunção "país legal versus país real". Não adiantava insistir, como seu adversário Rui Barbosa, em fazer cumprir a letra da lei, mas reconhecer o "idealismo da constituição", e superá-lo. Em livro com esse título, Oliveira Vianna sustentou que o remédio para essa disjunção era um Estado forte que asseguraria seus interesses contra os interesses mesquinhos, porque privados, dos clãs familiares. Para isso seria necessário passar por cima da Constituição artificial, porque liberal, ou elaborar uma carta constitucional em que o império da lei fosse uma ficção.

CORPORATIVISMO
Barbosa Lima Sobrinho, em sua biografia de Torres, mostra a influência decisiva dessa agenda na criação das instituições da Era Vargas –cujos principais atores políticos reuniam-se na Sociedade dos Amigos de Alberto Torres, fundada em 1932. Um dos seus membros, Oliveira Vianna, foi artífice de instituições com as quais convivemos até hoje, as estruturas corporativistas que regulam o mercado de trabalho no Brasil: a Justiça do Trabalho, o imposto sindical, a unicidade sindical, o IAA (Instituto do Açúcar e do Álcool), o IBC (Instituto Brasileiro do Café) e outros órgãos do intervencionismo econômico, como o Código de Águas e de Minas –a lista é longa.

Vianna flertou abertamente com o racismo e o fascismo, mas a maioria dos arquitetos do Brasil contemporâneo não aderiu abertamente a projetos totalitários. A historiografia brasileira criou uma expressão própria para identificar o conteúdo substantivo do programa desses publicistas: "liberais autoritários", por buscarem fortalecer direitos individuais a partir de instrumentos autoritários. Na balança, na realidade, esses direitos pesavam muito menos do que a razão de Estado.

É fundamental enfatizar que Uruguai, Torres e Oliveira Vianna não eram literatos. Não moldaram apenas a visão de mundo dos brasileiros, tal como Sérgio Buarque de Holanda. Uruguai, Torres e Oliveira foram todos membros de cortes superiores e presidentes de província e Estados –além de ministros. Foram homens de Estado, construtores de instituições. Influenciaram gerações de militares golpistas e a esquerda brasileira.
A rejeição ao liberalismo naquele contexto não foi um fenômeno brasileiro –só que no Brasil deitou raízes que permanecem até hoje. As democracias maduras fortaleceram o Poder Executivo e aprofundaram a democracia, extirpando a dimensão iliberal; no Brasil só fizeram a primeira tarefa, não a segunda. Muitas instituições (do mercado de trabalho etc.) continuam intactas até hoje e apresentam patologias desconhecidas no resto do mundo (como a existência de 38 mil sindicatos inorgânicos).

O denominador comum do programa conservador, à esquerda e à direita, era o caráter subordinado que questões relativas à regra da lei, a responsabilização e controle democrático do Estado ocupavam na agenda de mudança. As instituições de controle e os direitos civis e políticos mereceram apenas notas de rodapé.

A emancipação individual via educação não entrou na agenda. A democracia era valor não universal: o ditador foi aclamado pelo queremismo como grande líder. Afinal, matava, mas redistribuía. Não importava se as lideranças de esquerda tivessem apodrecido no calabouço do Estado Novo. Um novo "xibolete" fornecia a defesa contra a denúncia do abuso de poder e da corrupção: a desqualificação como udenismo.
A perda da eficácia simbólica dessa arma retórica no Brasil na atual conjuntura é sinal de mudança na cultura política.

Fortalecer o Poder Executivo na nova era industrial era imperativo, mas, ao mesmo tempo, seria necessário fortalecer os controles democráticos, como insistia Afonso Arinos. Essa agenda só foi enfrentada na Constituição de 1988, quando houve delegação significativa de poder ao Ministério Público, ao Judiciário, aos tribunais de contas. As reformas dos anos 1990 também eliminaram parte do legado varguista.

A República Velha viveu a maior parte do tempo sob estado de sítio e poucas vozes se insurgiam contra o militarismo, o abuso de poder, a falta de competição política, a corrupção. O único a se levantar contra o estado de coisas vigente foi Rui Barbosa. Para ele, o presidente brasileiro havia se convertido no "poder dos poderes, o grande eleitor, o grande nomeador, o grande contratador, o poder da bolsa, o poder dos negócios, e o poder da força. Quanto mais poder tiver menos lhe devemos cogitar na ditadura [...] por todos reconhecida mas tolerada, sustentada, colaborada por todos".

Rui e poucos outros buscaram seis vezes aprovar a Lei de Responsabilidade, sem sucesso: "Ainda não houve presidente nesta democracia republicana que respondesse por nenhum dos seus atos. Ainda nenhum foi achado a cometer um só desses delitos, que tão às escâncaras cometem. A jurisprudência do Congresso Nacional está, pois, mostrando que a Lei de Responsabilidade, nos crimes do chefe do Poder Executivo, não se adotou, senão para não se aplicar absolutamente nunca".

E concluía: " O presidencialismo brasileiro não é senão a ditadura em estado crônico, a irresponsabilidade geral, a irresponsabilidade consolidada, a irresponsabilidade sistemática do Poder Executivo". A lei pedida por Rui só foi aprovada 40 anos depois, e debatida seriamente apenas na atual conjuntura de crise do país.

GRANDE ELEITOR
O monopólio do poder pelos incumbentes e o abuso do cargo estão patentes na falta de competição política: presidentes eleitos com 90% (Rodrigues Alves) ou 99,7% (Washington Luís) dos votos.

Na denúncia de Rui, em 1914, estão apontadas as principais mazelas do Brasil, que surpreendem por sua atualidade: o presidente orwellianamente denominado por Rui de "O Grande Eleitor" exercia e continua a exercer papel decisivo na sobrevivência política dos deputados e senadores na barganha por emendas ao Orçamento e distribuição de cargos na base aliada.

Na República Velha, as eleições eram uma disputa para selecionar quem desfrutaria "o privilégio de ser o aliado do poder central" (Nunes Leal) –padrão que foi decerto muito mitigado com a introdução do multipartidarismo. Como Rui afirmou, os governos eram "pais e senhores das maiorias legislativas". Hoje essas maiorias continuam sendo construídas à sombra do Executivo, mas não ancoradas em arranjos programáticos –e sim em fundos públicos.

O presidente era e continua sendo em graus distintos "O Grande Nomeador", detendo o poder de nomear e demitir milhares de servidores. O presidente também é "O Grande Contratador". Usa e abusa do orçamento público em relações incestuosas com o setor privado. Modernamente manipula o crédito de bancos públicos sob seu controle direto e maneja politicamente os investimentos de fundos de pensão. O presidente encarna, e continua a fazê-lo, o poder da Bolsa, o poder dos negócios. Na ordem social de acesso limitado não há distinção entre empresa e Estado: essas esferas se amalgamam intimamente. A falta de instituições que representem compromissos críveis eleva os custos de transação e cria uma estrutura de incentivos danosa ao desenvolvimento endógeno.

As instituições são a chave para o desenvolvimento, para o chamado novo institucionalismo econômico de North e da nova economia política do desenvolvimento de Daron Acemoglu e coautores. A natureza e a qualidade das instituições explicam em grande medida o sucesso e fracasso das nações.

As "raízes do Brasil"–a chave para a compreensão do dilema brasileiro– são as instituições políticas e econômicas extrativas que foram implantadas ou a ordem social de acesso limitado que caracterizou a sociedade brasileira, para utilizar conceitos dessa literatura. Historicamente o traço distintivo foi a exclusão política e social: do escravo, do analfabeto e das mulheres.

A extensão do sufrágio para as mulheres e a criação da Justiça Eleitoral em 1932 (reduzindo as fraudes) aumentou a inclusão. A introdução da representação proporcional permitiu pela primeira vez na história que incumbentes fossem derrotados, revigorando a participação política e o pluralismo. Mas a exclusão do analfabeto perdurou até a Emenda Constitucional 25 de 1985. Só com a recente redemocratização a participação política se universalizou.

Os três pré-requisitos ("doorstep conditions") –império da lei, controle da violência e instituições impessoais– para a transição à sociedade de acesso aberto, segundo North, só agora parecem ter adquirido alguma materialidade.

Podemos dizer gramscianamente que, enquanto "a velha ordem morre e a nova não nasce, ainda surge uma grande variedade de sintomas mórbidos": sua manifestação é o desfile de descalabros a que os brasileiros têm assistido com perplexidade.

O Brasil de grande parte do século 20 é uma ordem social de acesso limitado. Em contraste com o que North denomina estados naturais frágeis e básicos, a violência aberta, produto da competição interelites, foi em grande parte contida. O império da lei é limitado e emerge em virtude do reconhecimento pelas elites de que permite ganhos recíprocos: surge do conluio rentista. O império da lei para Acemoglu resulta da contenda redistributiva; para North ele é produto de um arranjo intraelite, de seu autointeresse (esta é a principal controvérsia entre eles).

Essa interpretação é mais persuasiva: o império da lei só tem tido alguma efetividade na contenda entre as elites políticas e econômicas. O regramento das disputas entre elites e não elites foi marcado pela impunidade. A teoria prevê que o império da lei expanda o seu escopo do círculo das elites para a sociedade como um todo. A identidade dos atores tem importado cada vez menos, como se pode observar nas decisões da instituições judiciais brasileiras.

Quanto à violência política, ela marcou o século 20, pelo menos até a redemocratização. O início da República foi um episódio militar, e eles foram atores fundamentais em 1922, 1926, 1930, 1937, 1945, 1954, 1964-85. Pela primeira vez na história, a violência parece domada.

Nas sociedades de acesso aberto, a "destruição criadora" leva permanentemente à criação e, pela competição, dissipação de rendas geradas pela inovação. Nas sociedades de acesso limitado, as rendas tendem a ser mais duradouras, embora possa ocorrer volatilidade e circulação nos setores das elites. As rendas são politicamente distribuídas, desencorajando a inovação e engendrando ciclos de "stop and go". Não há componente endógeno no desenvolvimento. As rendas se manifestam das mais variadas formas: crédito subsidiado, direcionado, acesso a contratos governamentais, regras de conteúdo, desonerações. E, para o Estado, a captura do imposto inflacionário.

O abuso de poder e o risco permanente de expropriação de contratos têm sido o traço distintivo no Brasil, e só na quadra atual observa-se pela primeira vez a efetiva punição das elites. Mas, se o chefe do Executivo é iliberal, a mudança sofre retrocessos.

MAJESTADE
Assim, as raízes do Brasil econômico são políticas. A essa mesma conclusão chegou, em 1932, Ernest Hambloch, cônsul britânico no Rio de Janeiro. Para ele o problema do atraso econômico do país resultava de suas instituições políticas e, particularmente, do abuso de poder presidencial. Em seu livro sugestivamente intitulado "Sua Majestade o Presidente do Brasil" (1936), sua crítica centrava-se no poder despótico exercido pelo Executivo e a ausência de "rule of law", o império da lei:

"Quando as coisas continuamente não estão bem em um país com os recursos formidáveis que o Brasil possui, deve haver uma constante que explique o fenômeno. Altas tarifas de importação, impostos de exportação, políticas de valorização com endividamento excessivo, falta de continuidade nas políticas de administração pública, distúrbios sociais e revoluções –todos esses fatores podem ser apontados para explicar as atribulações do comércio e das finanças públicas. Mas esse fatores não são as causas fundamentais e eles próprios não explicam nada!"

E conclui: "As raízes dos problemas brasileiros devem ser buscadas nas deficiências do regime político".

A forte tradição iliberal é a grande vencedora no processo histórico de construção do Estado no país. Sustentar o contrário é perder de vista o essencial: as instituições políticas brasileiras foram forjadas a partir de uma profunda rejeição de uma visão liberal "latu senso". As raízes do Brasil político e econômico não estão fincadas na demonização do Estado: pelo contrário, estão profundamente imbricadas na sua santificação. A transição começou, embora a grande variedade de sintomas mórbidos cause perplexidade.

MARCUS ANDRÉ MELO é professor titular de ciência política da Universidade Federal de Pernambuco e foi professor visitante nas universidades Yale e MIT.

LINKS PARA OS TEXTOS DE JESSÉ SOUZA:

TEXTO DE 10/01: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2016/01/1727369-a-quem-serve-a-classe-media-indignada.shtml
TEXTO DE 21/02: http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2016/02/1740875-o-partido-da-sociedade-para-poucos-jesse-souza-rebate-marcus-melo.shtml



82 - Ódio do Ocidente

QUANDO A INVEJA DO OCIDENTE VIRA ÓDIO
SLAVOJ ZIZEK
tradução CLARA ALLAIN
FOLHA DE SÃO PAULO 31/01/2016  

Quem são os "oito odiosos" do filme de Quentin Tarantino?1 O grupo inteiro –brancos racistas e um soldado negro da União (na Guerra Civil americana), homens e mulheres, agentes da lei e criminosos–, todos os participantes, sem exceção, são igualmente perversos, brutais e vingativos.

O momento mais constrangedor do filme acontece quando o oficial negro (representado pelo magnífico Samuel L. Jackson) conta a um velho general confederado, em detalhes e com prazer evidente, como matou o filho racista dele, responsável pela morte de muitos negros: depois de forçá-lo a marchar nu sob vento gelado, Jackson promete ao sujeito branco morrendo de frio que receberá uma coberta se lhe propiciar sexo oral. Mas, depois que o sujeito o atende, Jackson descumpre sua promessa e o deixa morrer. Assim, não há mocinhos na luta contra o racismo –todos estão engajados na luta com brutalidade máxima.

A lição a tirar dos ataques sexuais recentes em Colônia não é estranhamente semelhante à lição do filme? Mesmo que (na maioria) os refugiados sejam de fato vítimas que fogem de países em escombros, isso não os impede de agir de modo desprezível. Tendemos a esquecer que não existe nada de redentor no sofrimento: ser uma vítima na posição mais baixa da escala social não converte você em alguma espécie de voz privilegiada da moralidade e da justiça.

Mas esse insight geral não basta –precisamos olhar mais de perto para a situação que deu origem ao incidente de Colônia. Em sua análise da situação global após os ataques em Paris, "Notre Mal Vient de Plus Loin" (nosso mal vem de mais longe, editado pela Fayard), Alain Badiou discerne três tipos predominantes de subjetividade no capitalismo global de hoje: o sujeito liberal-democrata ocidental "civilizado", de classe média; as pessoas de fora do Ocidente dominadas pelo "desejo do Ocidente", tentando a qualquer custo imitar o modo de vida dito "civilizado" das classes médias ocidentais; e os niilistas fascistas, aqueles cuja inveja do Ocidente se converte em ódio autodestrutivo mortal.

No breve ensaio, Badiou deixa claro que aquilo que a mídia descreve como "radicalização" de muçulmanos é fascistização pura e simples: "Esse fascismo é o anverso do desejo frustrado do Ocidente, organizado de maneira mais ou menos militar, seguindo o modelo flexível de uma gangue mafiosa e com colorizações ideológicas variáveis em que o lugar ocupado pela religião é puramente formal".

A ideologia da classe média ocidental possui duas características opostas: ela exibe arrogância e crença na superioridade de seus valores (direitos humanos e liberdades universais ameaçados pelos "outsiders" bárbaros), mas, ao mesmo tempo, é obcecada pelo medo de que a área sob seu domínio seja invadida por bilhões de pessoas que estão fora dela, que não contam no capitalismo global, pois nem produzem commodities nem as consomem; o medo de seus membros é passar a fazer parte da fileira de excluídos.
A expressão mais clara do "desejo do Ocidente" são os refugiados imigrantes: o desejo deles não é revolucionário –é o desejo de deixar seu hábitat devastado para trás e viver na terra prometida do Ocidente desenvolvido. (Os que ficam para trás tentam criar em seus países cópias miseráveis da prosperidade ocidental, como as partes "modernizadas" encontradas em toda metrópole do Terceiro Mundo, em Luanda, em Lagos, etc., com shopping centers, cafés que vendem cappuccinos etc.)

Como para a maioria dos candidatos esse desejo não pode ser satisfeito, uma das opções restantes é a reversão niilista: a frustração e a inveja se radicalizam, dando lugar a um ódio do Ocidente, assassino e autodestrutivo, e e as pessoas buscam a vingança violenta. Badiou vê essa violência como expressão pura da pulsão de morte, uma violência que só pode culminar em atos de (auto)destruição orgiástica, sem qualquer visão séria de uma sociedade alternativa.

Badiou tem razão ao enfatizar que não há potencial emancipador na violência fundamentalista; contudo, por mais anticapitalista que esta possa se dizer, ela é um fenômeno estritamente inerente ao universo capitalista global, seu "fantasma oculto", na definição do autor. A verdade básica do fascismo fundamentalista é a inveja; mesmo em seu ódio do Ocidente, o fundamentalismo tem raízes no desejo do Ocidente; estamos diante da reversão comum do desejo frustrado em agressividade, descrita pela psicanálise, e o islã apenas fornece a forma para embasar esse ódio (auto)destrutivo.

AMOR-PRÓPRIO
Esse potencial destrutivo da inveja é a base da conhecida distinção traçada por Rousseau em "Diálogos ou Rousseau Juiz de Jean-Jacques" entre o egotismo, "amour-de-soi", o amor de si mesmo (o amor por si próprio que é natural), e o "amour-propre", amor-próprio, a preferência pervertida por si mesmo em detrimento dos outros, em que a pessoa se concentra não tanto em alcançar uma meta, mas em destruir o obstáculo que se interpõe a ela:

"As paixões primitivas, todas as quais tendem diretamente para nossa felicidade e cujo princípio é apenas o amor de si mesmo, nos levam a lidar apenas com objetos que se relacionem com elas e são todas essencialmente amáveis e ternas; contudo, quando são desviadas de seus objetos por obstáculos, elas se ocupam mais com o obstáculo do qual querem se livrar do que com o objeto que procuram alcançar, mudando com isso sua natureza e tornando-se irascíveis e odiosas. É assim que o amor de si mesmo, um sentimento nobre e absoluto, converte-se em amor-próprio, ou seja, um sentimento relativo com o qual nos comparamos, um sentimento que exige preferências, cujo prazer é puramente negativo e que não procura encontrar satisfação em nosso próprio bem-estar, mas apenas no infortúnio de outros."

Assim, uma pessoa perversa não é um egotista, "que pensa apenas em seus próprios interesses". O verdadeiro egotista está ocupado demais cuidando do que o beneficia para ter tempo de fazer mal aos outros. O vício primário de uma pessoa perversa é preocupar-se mais com os outros que com ela mesma. Rousseau descreve um mecanismo libidinal preciso: a inversão que gera o deslocamento do investimento libidinal do objeto para o próprio obstáculo.

Isso pode muito bem ser aplicado à violência fundamentalista, independentemente de estarmos falando do atentado de Oklahoma City em 1995 ou do ataque ao World Trade Center em 2001. Em ambos os casos, trata-se de ódio puro e simples: destruir o obstáculo, o edifício federal de Oklahoma City ou as Torres Gêmeas, era o que realmente interessava, e não alcançar a meta nobre de uma sociedade verdadeiramente cristã ou muçulmana –veja-se o que diz Jean-Pierre Dupuy em "Petite Metaphysique des Tsunamis" (Seuil).
Essa fascistização pode exercer certa atração sobre a juventude imigrante frustrada que não consegue encontrar um lugar próprio nas sociedades ocidentais ou uma perspectiva com a qual se identificar. A fascistização oferece a esses jovens uma saída fácil para sua frustração: uma vida cheia de emoções e riscos disfarçados de dedicação religiosa sacrificial, somada à satisfação material (sexo, carros, armas...) –não esqueçamos que o Estado Islâmico também é um grande empreendimento comercial mafioso, que vende petróleo, estátuas antigas, algodão, armas e mulheres escravas –"um misto de propostas heroicas mortais e, simultaneamente, de corrupção ocidental por produtos", como escreve Badiou em seu livro.

É desnecessário dizer que essa violência fascista-fundamentalista é apenas um dos modos de violência pertinentes ao capitalismo global e que devemos ter em mente não apenas as formas de violência fundamentalista nos próprios países ocidentais (populismo anti-imigrante, etc.), mas, sobretudo, a violência sistemática do próprio capitalismo, desde as catastróficas consequências da economia global até a longa história das intervenções militares.

IMPOTÊNCIA
O fascismo islâmico é um fenômeno profundamente reativo no sentido nietzschiano do termo, uma expressão de impotência convertida em raiva autodestrutiva. Assim, ao mesmo tempo em que concordo com o sentido geral da análise de Badiou, considero problemáticas três de suas afirmações.

Em primeiro lugar, a redução da religião, forma religiosa de niilismo fascista, a elemento secundário superficial: "A religião é apenas uma vestimenta; ela não é de maneira alguma o xis da questão; é apenas uma forma de subjetivação, não o conteúdo real da coisa", escreve Badiou.

Ele está totalmente certo quando diz que a procura pelas raízes do terrorismo muçulmano de hoje em textos religiosos antigos (a história de "já estava tudo no Alcorão") é enganosa: devemos, em vez disso, nos concentrar no capitalismo global de hoje e conceber o fascismo islâmico como um dos modos de reação à atração desse capitalismo, através da inversão da inveja em ódio.

Mas, se vista criticamente, toda religião não é uma espécie de vestimenta, e não o cerne da questão? A religião não é, em seu próprio cerne, uma "forma de subjetivação" do dilema das pessoas? E isso não equivale a dizer que uma vestimenta é, em certo sentido, "o xis da questão", o modo como os indivíduos vivem sua situação? Não há como recuar um passo e, de alguma maneira, ver as coisas de fora, como elas "realmente são".

Daí advém a identificação, demasiado apressada, de refugiados e migrantes como um "proletariado nômade", uma "vanguarda virtual da gigantesca massa de pessoas cuja existência não é levada em conta no mundo do modo como ele é". Não são os migrantes (em sua maioria, pelo menos), os mais fortemente possuídos pelo "desejo do Ocidente", aqueles que se rendem mais profundamente ao fascínio da ideologia hegemônica?
Finalmente, a exigência ingênua de que devemos "ir ver quem é esse outro do qual se fala, quem são realmente essas pessoas". "Precisamos reunir seus pensamentos, suas ideias, sua visão das coisas e inscrevê-los, e a nós mesmos, em uma visão estratégica do destino da humanidade", defende Badiou.

OUTRO
Falar é fácil: esse outro é, como descreve o próprio Badiou, totalmente desorientado, possuído pelas atitudes opostas da inveja e do ódio, ódio esse que em última análise expressa seu próprio desejo reprimido pelo Ocidente (razão pela qual o ódio se transforma em autodestruição).

Faz parte de uma metafísica humana ingênua pressupor que exista algum núcleo humano "mais profundo" de solidariedade global por baixo desse ciclo vicioso de desejo, inveja e ódio. Não faltam relatos mostrando que muitos sírios constituem uma exceção entre os refugiados: nos campos de transição, eles limpam a sujeira que fazem, comportam-se de modo gentil e respeitoso; muitos deles têm alto nível de instrução e falam inglês, com frequência até pagam pelo que consomem –em suma, são como nós, como nossas classes médias educadas e civilizadas.

(E eles chegam a tentar criar solidariedade com os europeus nativos: na Eslovênia, a mídia divulgou casos em que imigrantes sírios de classe média entabularam conversas com eslovenos que os estavam ajudando, precavendo-os contra a maioria dos outros refugiados, que descreveram como brutais e primitivos.)
É comum e bem-visto dizer que os refugiados violentos representam uma minoria e que a maioria deles tem respeito profundo pelas mulheres. Embora isso seja verdade, é claro, devemos, mesmo assim, lançar um olhar mais atento sobre a estrutura desse respeito: que tipo de mulher é "respeitada" e o que se espera dela com esse respeito? E se a mulher for "respeitada" na medida em que (e apenas na medida em que) se enquadrar no ideal da criada dócil que cumpre suas tarefas fielmente, de modo que seu homem possa explodir em fúria se ela sair de seu controle e agir com plena autonomia?

Nossa mídia normalmente opõe refugiados "civilizados" de classe média a refugiados "bárbaros" de classe mais baixa, que roubam, assediam nossos cidadãos, comportam-se violentamente com mulheres, defecam em público...

Em vez de rejeitar isso tudo como propaganda racista, devemos munir-nos da coragem para discernir nisso um instante de verdade: a brutalidade, chegando à crueldade total em relação aos fracos, aos animais, às mulheres etc., é uma característica tradicional das "classes mais baixas"; uma de suas estratégias de resistência aos que estão no poder sempre foi uma manifestação apavorante de brutalidade, que visa perturbar o senso de decência da classe média.

CARNAVAL
Sentimos a tentação de interpretar assim também aquilo que aconteceu em Colônia na noite do Réveillon –como um carnaval obsceno da classe mais baixa, por exemplo, na descrição do jornal britânico "The Guardian":

"A polícia alemã investiga denúncias de que dezenas de mulheres teriam sido assaltadas e sexualmente agredidas no centro de Colônia durante os festejos do Ano-Novo, em algo que um ministro descreveu como 'uma dimensão de crime inteiramente nova'. De acordo com a polícia, os responsáveis pelos ataques sexuais e numerosos roubos teriam origem árabe ou norte-africana. Mais de cem denúncias foram feitas à polícia, um terço das quais ligadas a agressões sexuais. O centro da cidade se converteu em uma 'zona sem lei': entre 500 e 1.000 homens descritos como bêbados e agressivos teriam sido responsáveis pelos ataques a pessoas que festejavam o Ano-Novo no centro da cidade alemã ocidental. Mulheres relataram terem sido cercadas por grupos de homens que as molestaram e assaltaram. Algumas pessoas atiraram fogos de artifício no meio da multidão, agravando o caos. Uma das vítimas foi violentada. Uma policial voluntária está entre as mulheres que teriam sido sexualmente agredidas."

Como se poderia prever, o incidente está crescendo: mais de 500 mulheres já fizeram denúncias, com acontecimentos semelhantes em outras cidades alemãs e na Suécia; há indicações de que os ataques teriam sido coordenados previamente, e "defensores do Ocidente civilizado" de direita, contra os imigrantes bárbaros, estão revidando com ataques a imigrantes, de modo que uma espiral de violência ameaça ser desencadeada.

Como era previsível, a esquerda liberal politicamente correta mobilizou seus recursos para minimizar o incidente, do mesmo modo como fez no caso dos abusos sexuais contra crianças em Rotherham, no Reino Unido, um ano atrás. Mas há mais, muito mais: o carnaval de Colônia deveria ser inserido na longa sequência cujo primeiro caso registrado data de Paris na década de 1730, o chamado Grande Massacre dos Gatos.
Na ocasião, um grupo de aprendizes de gráficos torturou e matou ritualmente todos os gatos que conseguiu encontrar, incluindo o gato de estimação da mulher de seu mestre. Os aprendizes eram literalmente tratados pior do que os gatos por ela adorados, especialmente "La Grise", a gatinha cinzenta favorita dela, como aponta Robert Darnton em "O Grande Massacre dos Gatos e Outros Episódios da História Cultural Francesa", cuja descrição seguimos aqui.

Certa noite os garotos resolveram corrigir essa situação injusta: jogaram sacos cheios de gatos semimortos no pátio e então os penduraram em forcas improvisadas. Os rapazes deliravam de alegria, de desordem, gargalhando. Mas por que a matança lhes parecia tão engraçada?

No Carnaval as pessoas comuns suspendiam as regras normais de comportamento e faziam uma inversão cerimonial da ordem social, colocavam-na de ponta-cabeça, numa procissão caótica. O Carnaval era o momento da hilaridade, da sexualidade e da juventude terem as rédeas soltas, e o povo frequentemente incorporava a tortura de gatos em sua diversão brutal.

Quando zombavam de um marido traído ou de alguma outra vítima, os jovens passavam um gato de mão em mão, arrancando seus pelos para fazê-lo uivar. Chamavam a isso "faire le chat". Os alemães o chamavam de "Katzenmusik", música dos gatos, termo que parece derivado dos uivos dos animais torturados.

A tortura de animais, especialmente gatos, foi uma diversão popular ao longo do início da era moderna na Europa. O poder dos felinos se concentrava no aspecto mais íntimo da vida doméstica: o sexo. "Le chat", "la chatte", "le minet" significam na gíria francesa a mesma coisa que "pussy" em inglês –a vulva.2 Essas palavras são empregadas como termos chulos há séculos.

Poderíamos, então, conceber o incidente de Colônia como uma versão contemporânea de "faire le chat"? Como uma revolta carnavalesca dos injustiçados? Não foi o simples desejo de satisfação de homens jovens, privados de sexo –isso poderia ser conseguido de maneira mais discreta, oculta–, foi antes de mais nada uma maneira muito pública de suscitar medo e humilhação, de expor as "pererecas" das alemãs privilegiadas a uma situação de impotência dolorosa. É claro que não existe nada de redentor ou emancipador, nada de efetivamente liberador em tal carnaval –mas é assim que funcionam os carnavais reais.

É por isso que esforços ingênuos para transmitir informações aos imigrantes –explicando a eles que nossos costumes sexuais são diferentes, que quando uma mulher anda de minissaia em público e sorri, isso não significa um convite sexual etc.– são exemplos de estupidez assombrosa. Eles sabem disso. Eles têm plena consciência de que o que estão fazendo destoa de nossa cultura predominante, mas o fazem precisamente para ferir nossas sensibilidades.

O que é preciso é mudar essa postura de inveja e agressividade vingativa, e não ensinar aquilo que eles já sabem muito bem.

A difícil lição a tirar disso tudo é que não basta simplesmente dar voz aos injustiçados do modo como eles estão: para concretizar a emancipação real, eles precisam ser educados –por outros e por eles próprios– para a liberdade.

Notas da tradutora:
1. Embora o filme tenha sido lançado como "Os Oito Odiados" no Brasil, a tradução mais próxima do original seria "os oito odiosos".
2. Em português, um termo assimilado seria "perereca".
SLAVOJ ZIZEK, 66, filósofo e psicanalista esloveno autor de, entre outros, "O Absoluto Frágil" (Boitempo).


sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

81 - A questão religiosa nos conflitos do Oriente Médio

The Middle East's Conflicts Are About Religion

February 13, 2016
A meme is gaining traction within American government and media, and it goes like this: The conflicts of the Middle East aren’t about religion. Jihadist violence? Garden-variety criminality, the president says. Young people flocking to ISIS? “Thrill-seekers,” posits the secretary of state, who are desperate for “jobs,” per a State Department spokeswoman. Iran’s belligerence? A reaction to ostracization, a former embassy hostage insists. Sunni-Shiite bloodletting? Jockeying for 
power, the pundits conclude.
It’s not just a false narrative, but a dangerous one. It’s true that the Middle East offers no easy policy options: witness Syria, where the choice of sovereign increasingly appears to be between the Islamic State and Islamic Republic (butneither of which, we’re told, takes Islam all that seriously). Still, if we’re to even try to address the region’s maladies, we have to first correctly diagnose its disease.
It’s not that religion is the only force at play. It’s not that the ranks of jihadist groups don’t also include common criminals, or that leaders never use religion to their own cynical ends (Saddam Hussein’s Faith Campaign is one salient example). It’s that these phenomena are relatively minor compared to the vast influence religious belief still wields across much of the Middle East and the broader Islamic world.
It is, of course, near impossible to empirically demonstrate the motivations behind human actions, whether individual or collective. That doesn’t mean, however, that our only recourse is to project our own motivations onto societies for which they don’t fit. The debate over the religiosity of groups like ISIS, or of regimes like Saudi Arabia or Iran, is largely confined to the Western chattering classes. In the Islamic Middle East, the influence of faith is more often than not taken as a given.
Polls are instructive. In 2013, Pew—one of the world’s leading pollsters—conducted a survey of thirty-eight thousand people in thirty-nine Muslim-majority countries. The results showed an overwhelming majority backed the implementation of Islamic law, particularly in countries that are some of the primary hubs of terror groups: 99 percent in Afghanistan, for example, and 91 percent in Iraq.
On matters of identity, results have been comparable. In Pew’s 2011 survey, 94 percent of respondents in Pakistan said they identify first as Muslims rather than Pakistanis. In Jordan, a Western-oriented country and close U.S. ally, three times as many identified primarily as Muslims. Even in comparatively secular Turkey (and, incidentally, in the United States), twice as many people identified more as Muslims than citizens of their respective countries.
For most Middle Eastern Muslims, it is a personal and professional 
third rail to call for the removal of religion from public life, let alone to call into question God’s existence. In Egypt, according to Pew, just 6 percent of respondents said the Quran need not be consulted in drafting laws, while more than eight in ten said those who leave the faith should be stoned to death (the Palestinian Authority, Afghanistan and Pakistan yielded similar results). In these countries at least, the community of secular-minded individuals, let alone atheists, is exceedingly small. Why then we do conclude that it is precisely those most loudly trumpeting their religious convictions who belong to it? I see three factors at play.
First, most post-religious Westerners have never felt the pull of faith. The prospect that a mentally sound person—let alone billions of them—would let spiritual conviction guide their most consequential actions doesn’t quite add up. So too the notion of religion as one’s primary identity marker. We deem one’s nation to be an entirely legitimate identity marker; indeed, it’s the default option, and in this country, failure to take sufficient pride in being American is grounds for suspicion. The prospect that faith, or even membership in a faith community, could fill that role rings hollow.
Second, from a policy perspective, nonreligious motives are more comforting. Addressing terrestrial motivations (money, land, grievance) is far easier than confronting a person’s closest-held beliefs and the immutable scripture that underlies them. That’s particularly the case because scrutinizing specific religious doctrines remains one of the last great taboos, all the more so when the faith in question is Islam.
That’s why even when religion is conceded to be at play, the assumption among right-thinking people is that faith is being “twisted” or “used” for some ulterior motive. Rarely considered is the possibility that billions of people take religion seriously and do their best to follow its precepts—precepts that can lead just as easily to charity and loving kindness as to tribalism and terror.
On January 4, Vox published a lengthy article on the Saudi-Iranian rivalry that concluded, predictably, that “it’s not really about religion.” The very next day, the same author published a similar piece that offered this: “No one who seriously studies the Middle East considers Sunni-Shia sectarianism to be a primarily religious issue.” That article approvingly cited a video by the Washington-based Al Jazeera anchor Mehdi Hasan, asserting that faith-based sectarian conflict is a “myth” and that regional rivalries are actually about “power, not piety.”
It’s particularly rich for Hasan to dismiss the very notion of sectarianism’s sway. In an undated YouTube video (it’s since been scrubbed from the Internet but a description is here), Hasan, who is Shiite, descends into a prolonged, tearful wail when recounting the story of the seventh-century Battle of Karbala, a formative moment in Shiite history in which Muhammad’s grandson Hussain was killed. In another, he describes “kuffar” (non-Muslims) as “cattle. . . animals bending any rule to fulfill any desire” (that video is still online). So much for Hasan’s pieties, as it were, over the power of faith and faction.
Nearly a year ago, Graeme Wood authored an Atlantic cover piece, “What ISIS Really Wants,” propounding the apparently revolutionary notion that the group is driven by genuine religious fervor, and that its fire is based on a literal reading of Islamic texts.
The backlash was swift. In the same outlet, Wood was condemned for demonizing Muslims, and in the New Yorker for playing into the hands of extremists. Last month, responding to the second Vox piece, Wood  tweeted: “Thought experiment: if these conflicts *were* about ‘ancient religious hatreds,’ how would they be different?”
It wasn’t so long ago that Westerners took religion seriously. The Crusades, the Inquisition and Europe’s wars of religion were about a lot of things—power, dynastic politics, land—but they were also genuinely, inseparably,fundamentally about religious belief. Barely a century ago, religion guided the lives of Westerners just as it does in much of the Islamic world today. For hundreds of millions in America it still does, and those Americans are rarely the ones asking whether the doctrinal devotion of most ISIS fighters, Saudi sheikhs or Iran’s mullahs is a sham.
The rest of us are increasingly expected to nod to certain shibboleths: that power, money, resources and hegemony are the stuff of human motivation and, by extension, of international relations. Belief, after all, isn’t—for the simple reason that it isn’t for us.
Oren Kessler is deputy director for research at Foundation for Defense of Democracies.
http://www.nationalinterest.org/feature/the-middle-easts-conflicts-are-about-religion-15205


quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

80 - Entraves ao crescimento econômico brasileiro

Unlocking Brazil’s Long-Term Growth Potential

By: Ashley Kindergan
Published: February 8, 2016

Brazil has certainly had its share of trials and tribulations lately: The economy is in recession, inflation is on the rise, budget deficits are widening, its sovereign debt rating has been downgraded, and the political environment is challenging. Yet, the country still has a lot going for it. It remains the largest economy in Latin America, and one that is rich in resources ranging from agricultural products to industrial metals. Home to some of the continent’s strongest political institutions, Brazil has also made significant strides in improving the economic well-being of its citizens over the past decade: The proportion of the population living in poverty has fallen from 17.3 percent in 2006 to 7.4 percent in 2014, according to the World Bank. What can Brazil do to leverage its strengths, re-ignite its economy, and regain its position as one of the world’s most exciting growth stories?

Experts gathered at Credit Suisse’s 2016 Latin America Investment Conference (LAIC) in January in Sao Paulo said that righting the fiscal ship is Brazil’s most pressing concern. But they also said that fixing two long-term structural issues—a closed economy and low productivity—is the key to building a strong foundation for solid long-term growth.

Opening to the World  

Brazil could have benefitted more from a rapid expansion in global trade over the last few decades if its economy were more open, said former Mexican President Felipe Calderón, a keynote speaker at the LAIC.  
Calderón contrasted the experiences of economies in the Mercosur trade alliance (Argentina, Brazil, Paraguay, Uruguay, and Venezuela) and those in the Pacific Alliance (Chile, Colombia, Mexico, and Peru). Pacific Alliance countries have relatively open economies and export mostly manufactured products, while Mercosur countries are relatively closed and rely much more on commodities exports, which left them particularly vulnerable to a commodities rout led by slowing demand in China. Commodities account for 67 percent Brazilian exports, and steep declines in the price of oil and iron ore, of which Brazil is the world’s third-largest producer, have hit the country hard. The economy shrank 3.7 percent in 2015, and Credit Suisse’s Brazil economists expect drops of 3.5 percent this year and 0.5 percent next – the first three-year contraction since 1901.  

 When it comes to the openness of its economy, while Brazil can claim significant growth in trade over the last half century-plus, it nevertheless lags other countries in that regard. The difference in the trade openness coefficient (the sum of exports and imports as a share of GDP) between Brazil and the rest of the world increased from 10.5 percentage points in 1960 (about 14 percent in Brazil and 24.5 percent worldwide) to nearly 33 in 2014 (some 26 percent in Brazil to some 59 percent worldwide), according to Credit Suisse.  

Among the reasons: Brazil has the highest customs tariffs in the world on consumer goods and intermediate products, and the second-highest tariffs on capital goods. The country also imposes heavy non-tariff barriers, including state and federal taxes, and it has not signed as many free-trade agreements as other countries. In 2014, the country had just five trade agreements, compared to 20 in the United States, 40 in Colombia, 44 in the Eurozone, 45 in Mexico, and 54 in Chile.  

And the fact of the matter is that closed economies have a harder time staying competitive than open ones. Trade barriers protect domestic industries, but keeping out foreign competitors also removes incentives for them to become more efficient. For example, said Calderón, Mexico’s remarkable post-crisis recovery stemmed partly from new trade agreements and removing tariff barriers throughout the economy. “The more tariff reductions you apply to a sector, the more competitive that sector becomes,” the former president said. “The big lesson is: open your market.”  

 Low and Slow Productivity  

Professor Ricardo Paes de Barros, Instituto Ayrton Senna Chair at the Brazilian university Insper, put Brazil’s slipping labor productivity in striking terms at the LAIC. In 1980, a Brazilian worker produced about the same amount, in value-added terms, as a South Korean worker; today, it would take three Brazilians to keep up with a Korean. Similarly, in the 80s, a Brazilian worker was 10 times as productive as a Chinese worker, whereas today the two are roughly equivalent.  

 In recent years, more Brazilian workers have moved out of agriculture and into service professions. Low-productivity, labor-intensive sectors, such as health care, education, and retail sales have grown fastest, with the share of workers in this segment of the market rising from 51 percent in 1996 to 59 percent in 2015. While Brazil’s overall productivity grew 13.4 percent over the past two decades, workers in industries that are inherently less productive grew 3.7 percent less productive.  

Credit Suisse attributes these productivity declines to the concentration of government workers, who earn higher salaries than private-sector workers in similar jobs in fields such as health and education. The relentless growth of Brazil’s public sector limits potential productivity growth, the bank’s economists say. The higher the public sector’s share of the Brazilian economy, the lower the odds that it can grow even a modest 2 percent over the next three years.  

Credit Suisse’s analysis suggests that Brazil could spend 43 percent less on all public services, 51 percent less on education, and 70 percent less on health care and still get the same results. The shortcomings of Brazil’s education system only contribute further to its sluggish productivity growth, Paes de Barros says. The professor thinks Brazil may need to bring in international consultants to help reform its education system, but that it also must do better at gathering and publicizing performance data from its many school districts to learn what works and what doesn’t. Brazil is still a young nation, with the share of working-age people set to expand for another six years. Investing more wisely in its youth is critical to the country’s future growth prospects.

 - See more at: https://www.thefinancialist.com/unlocking-brazils-long-term-growth-potential/#sthash.agSwJrbb.dpuf