domingo, 17 de julho de 2016

91 - Direita e esquerda na economia

O funcionamento da economia segundo a direita e a esquerda

domingo, 3 de julho de 2016

90 - A esquerda e o desenvolvimento econômico

Para ter chances em 2018, esquerda precisa encarar a economia

Não é um momento bom para a discussão econômica na esquerda brasileira. A nova matriz econômica do primeiro governo Dilma claramente deu errado. Embora seja legítimo discutir o quanto da crise atual foi causada pelos erros da matriz, é indiscutível que se gastou muito por um crescimento que não veio –e quem veio foi a inflação. Quando Dilma, logo após a eleição de 2014, nomeou Joaquim Levy para a Fazenda, esperava-se uma autocrítica petista. Quando o desenvolvimentista Nelson Barbosa assumiu no lugar de Levy e propôs um ajuste muito parecido, a autocrítica parecia inevitável.
Mas a guerra do impeachment tornou secundária toda discussão que não fosse sobre quem, PT/PMDB ou PMDB/PSDB, teria o direito de distribuir as verbas e cargos do governo federal (e se meter na Lava Jato). O PT se recolheu em um discurso antiajuste militante que já sinalizava o prognóstico de que a volta para a oposição era inevitável. O quinto congresso do partido em Salvador, no ano passado, prosseguiu em total negação da necessidade de ajuste. Há muito pouca coisa nos manifestos de esquerda recentes que pareça atraente para um estudante de economia, e isso diminui a reserva de potenciais ministros da Fazenda dos futuros governos progressistas.
As circunstâncias do impeachment certamente favorecem o instinto de voltar a ser o PT dos anos 1980. A manobra parlamentar que afastou Dilma Rousseff tem mais cara de Brasil pré-89 do que qualquer coisa nos manifestos do PT. Mas isso é um motivo ruim para não discutir o fracasso da nova matriz econômica. Não só porque honestidade intelectual sempre serve para alguma coisa, mas também porque o novo governo é extremamente impopular e ainda mais exposto à Lava Jato do que o anterior. A esquerda precisa estar pronta para chegar em 2018 com um discurso para ganhar a presidência, não a eleição para o centro acadêmico. Por esse motivo, senão por todos os outros, precisa voltar a falar sério sobre economia.
Há debates interessantíssimos e intelectualmente instigantes a serem feitos sobre a economia brasileira, mas este aqui não será um deles. A autocrítica necessária é só o reconhecimento de alguns fatos básicos, como a necessidade de controle das contas públicas e contenção da inflação. É a mesma autocrítica que o PT fez quando Lula ganhou a presidência. Para além disso (e se tivermos apenas isso já ficarei bastante satisfeito), seria bom se iniciássemos negociações políticas sobre a reforma da Previdência ou do sistema tributário com a esquerda na mesa. Daí em diante, no mundo de debates sofisticados sobre câmbio e poupança, inovação e abertura comercial, há gente muito melhor do que eu para ser lida, à esquerda e à direita.
E este não é um texto voltado para economistas. Se você é economista e precisa ouvir o que vou dizer, repense suas escolhas de vida. É uma discussão com os intelectuais petistas, em geral oriundos de outras ciências sociais e das humanidades –assim como eu–, e com a esquerda universitária em geral. Pois estou convencido de que o problema somos nós.
LADO BOM
Não é inevitável que a esquerda seja ruim de economia. Nos Estados Unidos, economistas progressistas como Paul Krugman ou Joseph Stiglitz têm ganhado a maior parte dos debates contra seus equivalentes republicanos. A esquerda europeia claramente tinha razão contra quem propôs austeridade logo após a crise de 2008. Durante os trinta anos gloriosos do pós-guerra, a esquerda no mundo desenvolvido geriu o capitalismo mais ou menos tão bem (ou tão mal, dependendo do país) quanto a direita. Foi um governo trabalhista que concedeu autonomia ao Banco Central britânico. Aqui na América Latina, as esquerda chilena e uruguaia administram bem economia, como, aliás, também o faz o governo do bolivariano Evo Morales (ao menos segundo opinião recente do FMI). A gestão econômica foi adequada durante os dois governos de Lula.
Note-se que, nos exemplos acima, os economistas de esquerda não acertaram apenas quando o que precisava ser feito era aumentar a intervenção do Estado na economia (como no dia seguinte ao da crise de 2008), mas também quando era necessário conter gastos ou tornar a gestão econômica mais previsível. Não há nada intrínseco ao esquerdismo que exija que seus defensores desequilibrem o orçamento público ou deixem a inflação sair de controle.
No que se refere a temas como equilíbrio fiscal, aliás, a esquerda deveria ser mais atenta do que a direita: quem depende de um Estado forte para atingir seus objetivos são os progressistas. Um Estado falido serve tanto à esquerda quanto um mercado inteiramente montado em cima de hipotecas "subprime" (segunda linha) e de produtos financeiros correspondentes serviu ao liberalismo.
Esquerda e direita discordarão sobre o quanto deve ser taxado, sobre como o dinheiro arrecadado deve ser gasto, mas não sobre o fato de que o quanto você consegue arrecadar impõe algum limite sobre o quanto você pode gastar.
Não se trata de discutir ortodoxia contra heterodoxia. As escolas de economia têm visões diferentes sobre o papel do câmbio desvalorizado como indutor do desenvolvimento, ou sobre o quanto do investimento deve ser direcionado pelo Estado. Esses debates são legítimos, intelectualmente instigantes, e de enorme importância prática, mas defendo que a esquerda seja agnóstica sobre todos eles. O que funcionar, funcionou, e o crucial é manter o foco sobre a redistribuição de renda e oportunidades.
Isso significaria não ter uma posição "oficial" da esquerda sobre toda uma gama de assuntos. Não há por que esperar que todos os que defendem a redistribuição de renda tenham a mesma opinião sobre o nível ideal da taxa de câmbio, por exemplo. Da mesma forma, a relação entre investimento estatal direto e privatização/concessões é um debate sobre fronteiras muitas vezes fluidas. Deixem de lado no momento (e, no que depender de mim, para sempre) os que propõem a estatização completa ou a privatização completa da economia (quase ninguém pertence a esses extremos). Os defensores de mais intervenção estatal direta estão falando sobre empreendimentos estatais que incluirão diversas camadas de subcontratação, financiamento privado e permanente risco de captura regulatória; os defensores da privatização discutem empresas privadas atuando sob diversas camadas de regulação estatal em mercados com competição ridiculamente imperfeita, e, novamente, permanente risco de captura regulatória. A diferença é muito menos radical do que parece.
A escolha entre as alternativas não parece diretamente relacionada a convicções sobre igualdade, e, aliás, é inteiramente dentro do reino do possível que situações diferentes sejam mais bem resolvidas com arranjos diferentes. Não é razoável marcar a diferença entre esquerda e direita primariamente pela tomada de posição em nenhum desses debates econômicos.
A prioridade da esquerda deve ser redistribuir renda e construir um Estado de bem-estar social, duas discussões em que os economistas (enquanto tais) só têm direito de aparecer para dizer como fazer melhor o que a política e a moral já tiverem decidido fazer.
Uma vez estabelecido esse princípio geral, é também necessário reconhecer que, historicamente, houve uma afinidade eletiva entre a esquerda e escolas de economia mais propensas a recomendar a intervenção do Estado na economia. A esquerda, afinal, já defende a intervenção do Estado na redistribuição de bens e oportunidades. Há um grau de ceticismo comum em relação aos resultados do funcionamento do livre-mercado que aproxima os defensores da redistribuição aos defensores da intervenção estatal.
CASAMENTO
Defendo, contudo, que esse seja um casamento aberto: os keynesianos e heterodoxos devem se sentir livres para recomendar, por exemplo, cortes em programas sociais, ou menores aumentos para o salário mínimo, quando essa for a recomendação de seus modelos. E a esquerda deve ser livre para recusar propostas heterodoxas que, por algum motivo (digamos, por aumentar a inflação, ou comprometer a capacidade fiscal do Estado) prejudiquem os mais pobres ou levem a aumentos da desigualdade de renda.
Eu, por exemplo, preferia que o governo Dilma tivesse sido um governo de ajuste econômico que enfrentasse a questão tributária que Lula não enfrentou. Teria sido melhor fazer o ajuste e, partindo de uma posição de força, comprar as brigas por redistribuição no Congresso. Isto é, eu preferia que o governo do PT tivesse sido mais à esquerda na questão tributária e mais ortodoxo em economia.
Mas também acho inteiramente possível que um governo heterodoxo menos comprometido com a esquerda –digamos, o de José Serra, rival de Dilma em 2010– tivesse obtido resultados melhores do que esses que os heterodoxos de esquerda obtiveram. Há economistas razoáveis, que não podem ser rotulados como pessoas ruins ou antipobres, e que acham que os salários subiram rápido demais durante o governo Dilma. Talvez a mesma coisa não tivesse acontecido em um governo heterodoxo de Serra. O mesmo pode ser dito sobre a questão fiscal: quando Nelson Barbosa deixou o governo Dilma por discordar (corretamente) da política fiscal, o heterodoxo José Luis Oreiro, ex-presidente da Associação Keynesiana Brasileira, escreveu em seu blog que isso era um sinal de que ele tinha acertado ao votar em José Serra em 2010.
Também não se trata de discutir keynesianismo ou "austericídio". Quando a crise brasileira se agravou, o economista liberal norte-americano Tyler Cowen escreveu em seu blog (o Marginal Revolution, um dos melhores do mundo) que gostaria de saber o que os críticos da austeridade teriam a dizer sobre isso. Afinal, o Brasil foi um país que se saiu excepcionalmente bem nos anos da crise em função de políticas de intervenção estatal. O fracasso brasileiro não seria prova de que os austeros estavam certos? Essa crítica é o exato reflexo da visão, muito comum na esquerda brasileira, de que o ajuste promovido por Joaquim Levy e Nelson Barbosa (ou agora, imagino, por Henrique Meirelles) seria a versão local do austericídio europeu.
As duas visões são falsas. As respostas à crise aqui foram diametralmente opostas às europeias, e, de fato, nos saímos melhor nos anos seguintes à crise do que os europeus. Mas as políticas de estímulo deveriam ter sido progressivamente desarmadas. O problema não foi ter sido Paul Krugman em 2009-10, foi não ter sido Tyler Cowen em 2011-12. A propósito, convém suspeitar da turma que defende política anticíclica, mas até hoje não foi vista defendendo ajuste em momento algum. Estamos sempre no mesmo momento do ciclo?
GASTO
Não é questão de heterodoxia, não é questão de keynesianismo: é muito mais básico. Não há nenhuma escola de economia que defenda que você pode gastar o quanto quiser. E esse parece ter sido o pressuposto indiscutível de tudo que a esquerda brasileira disse sobre economia desde que Joaquim Levy virou ministro da Fazenda. Quando um economista heterodoxo como Nelson Barbosa criticou a política fiscal em 2013, ou quando propôs a reforma da Previdência em 2015, a esquerda fingiu que não ouviu. Economistas heterodoxos como Bresser-Pereira e José Luis Oreiro foram citados pela esquerda sempre que se tratava de criticar juros altos, mas muito raramente quando defendiam ajuste nas contas públicas. Os economistas heterodoxos subiram ou desceram na bolsa de valores intelectual da esquerda conforme disseram o que ela queria ouvir.
É nessa submissão da discussão econômica à política que devemos procurar a raiz do problema. E a formação intelectual do PT –que foi a minha– favoreceu esse erro.
O PT foi formado quando o ambiente intelectual na esquerda mundial era marcado por uma forte reação ao marxismo soviético. A simples presença de trotskistas e católicos em posições de influência dentro do partido garantia o distanciamento do marxismo canônico, já em franca decadência no começo da década de 1980. Os intelectuais petistas da época liam com entusiasmo autores que criticavam o marxismo ortodoxo, de Gramsci e Foucault a Lefort e Castoriadis, passando por Negri e Deleuze. Grande parte desses autores, a propósito, criticavam o marxismo pela esquerda, de pontos de vista que talvez despertassem mais entusiasmo nos anarquistas e em outras esquerdas dissidentes do que nos comunistas.
Um dos traços distintivos desse pensamento era seu antieconomicismo. O marxismo soviético era baseado na ideia de que o desenvolvimento econômico determina a evolução das estruturas políticas e ideológicas. A reação a esse dogma, seja por pós-marxistas, seja por marxistas "ocidentais", tomou a forma de diversas reafirmações da importância do político, da cultura e do imaginário, do corpo, enfim, de tudo que havia sido excluído da estreita visão de mundo dos manuais de marxismo.
Entre os intelectuais de esquerda, essa reação foi indiscutivelmente saudável, produzindo toda uma leva de trabalhos historiográficos sobre escravidão no Brasil que fugia dos determinismos economicistas. A reflexão sobre gênero foi decisivamente impulsionada pela incorporação de demandas não econômicas ao programa de esquerda em pé de igualdade com as reivindicações econômicas usuais. Experiências como o orçamento participativo de Porto Alegre colocavam em questão os limites da gestão tecnocrática.
Mas essa trajetória intelectual criou na esquerda pós-marxista um seríssimo deficit econômico. Confrontados com um raciocínio econômico, o reflexo de nossa esquerda (o meu, inclusive) é procurar uma forma de reduzi-lo a um problema político, pois o arsenal teórico da esquerda pós-marxista é muito melhor na discussão de questões de poder do que nas relativas às regularidades características das instituições de mercado.
Uma injeção de ceticismo sobre o quão científicas são as discussões econômicas, aliás, pode ser bastante saudável para os economistas: isto é, para quem já parte do princípio de que existem regularidades econômicas identificáveis e está familiarizado com seus padrões básicos. Meu objetivo aqui é criticar quem usa a objeção "a economia também é um campo de luta" para se dispensar de conhecer essas regularidades, ou para evitar levá-las a sério como condicionantes da ação governamental.
Para citar um exemplo escolhido por ser mais sofisticado que os outros, tomemos a discussão de André Singer sobre o fracasso da nova matriz econômica, publicado em 2015 na edição 102 da revista "Novos Estudos", do Cebrap. Singer lê o episódio inteiro como uma luta política entre uma coalizão produtivista (trabalhadores e empresários) e uma coalizão rentista liderada pelo mercado financeiro. O experimento desenvolvimentista de Dilma teria sido uma ofensiva da coalizão produtivista, que, entretanto, sob forte pressão política e de mídia, foi derrotada quando o Banco Central, em 2013, capitulou e voltou a subir os juros.
Não se trata de negar que existam conflitos políticos envolvidos na confecção da política econômica, e, aliás, os melhores economistas não o negam. Nenhum economista sério negará que existam grupos de pressão, captura regulatória, "rent-seeking", diferenças evidentes de poder entre os vários agentes etc.
Mas a economia não é só isso. Não é possível analisar o abandono da nova matriz econômica sem levar em conta que seus resultados foram muito ruins: apesar de tudo que foi gasto com subsídios e isenções no primeiro mandato de Dilma, o crescimento econômico se desacelerou, e a inflação subiu. Quando o BC sobe os juros em 2013, já se sabia que os resultados de 2012 haviam sido péssimos. E 2012 foi, segundo Singer, o ano-chave do "experimento desenvolvimentista".
Admitamos, para facilitar a discussão, que houve o choque de coalizões descrito por Singer. Se o PIB em 2012 tivesse crescido 6% (e não 1,8%), é certo que o governo Dilma teria dobrado a aposta na nova matriz. Não haveria campanha de mídia capaz de derrubar a popularidade de um governo que atingisse essa taxa de crescimento. Um crescimento nesse ritmo traria inclusive apoio de parte importante do empresariado ao governo. E todos sabemos como os aliados políticos vão e vêm conforme a popularidade desce ou sobe. Perguntem a Dilma Rousseff.
De modo que, mesmo admitindo a narrativa de Singer, é preciso admitir que a coalizão apoiada pela esquerda apresentou um programa ruim, que produziu resultados ruins. O motivo pelo qual esses resultados foram ruins devem ser buscados em mecanismos internos à economia. O aumento de juros de 2013, por exemplo, não teve nada a ver com a aceleração da inflação?
praia Diga-se o que quiser de Karl Marx, dessa vez a culpa não é dele. O estudo das relações entre as categorias da economia de mercado, seja em "O Capital", seja nos manuais usados no departamento de economia de Chicago, claramente supõe que algumas coisas (certamente não todas) acontecem por motivos estritamente econômicos. Toda a análise da esquerda sobre o capitalismo supõe justamente que as instituições de mercado geram certos incentivos e agregam as ações tomadas sob estes incentivos de uma certa forma. Se você convencesse o velho Karl de que os economistas petistas descobriram que sempre é possível, em uma economia capitalista, sob a direção política certa, crescer aceleradamente, distribuir renda, garantir pleno emprego e evitar inteiramente as oscilações de mercado, tudo isso sem nunca sacrificar a classe trabalhadora, ele largaria a biblioteca do museu britânico e iria para a praia.
Os economistas continuarão discutindo as melhores maneiras de aumentar a taxa de poupança ou de promover a inovação tecnológica, e cada um de nós concordará com uma das partes no debate, mas tudo que este texto pede aos intelectuais da esquerda brasileira é que não criem dentro dos partidos e movimentos progressistas um ambiente em que as ideias econômicas sejam julgadas apenas pela conformidade com a postura política geral do movimento. Foi assim que o partido republicano norte-americano morreu.
É preciso defender a autonomia do econômico diante das correntes intelectuais hegemônicas na esquerda desde 1968, como antes foi necessário defender a autonomia do político diante do marxismo ortodoxo. É preciso reconhecer a soberania do pensamento econômico sobre o território intelectual que lhe é de direito, ainda que continue sendo legítimo e necessário combatê-lo em seus momentos imperialistas. Quando perceberem em seus alunos o reflexo de chamar todo ajuste fiscal de "fiscalismo" ou todo aumento de juros de "rendição ao rentismo", matem essas ideias no berço.

CELSO ROCHA DE BARROS, 43, colunista da Folha, é doutor em sociologia pela Universidade de Oxford.

89 ´Sobre o livro "Brazil in transition"

Livro defende que o Brasil já iniciou transição para se tornar desenvolvido


RESUMO O livro "Brazil in Transition", que acaba de ser publicado por um professor americano e três brasileiros, conclui que o país se colocou, a partir dos anos 1990, numa rota firme para se tornar desenvolvido. Leitura é fecunda, pois enfatiza de modo sistemático o papel das instituições na história, mas sujeita a caloroso debate.
Para Robert Solow, o americano premiado em 1987 com o Nobel e perfilado entre os economistas mais influentes da segunda metade do século 20, a sua disciplina está para a sociedade assim como a física para a natureza. "Existe um único modelo válido para o mundo. Ele só precisa ser aplicado", escreveu em 1985.
A chamada síntese neoclássica, definida na geração de Paul Samuelson (1915-2009) e legada à de Solow, fez repercutir por décadas nas mais reputadas academias do globo esse modelo de como o mundo funcionaria. A convergência da grande maioria das nações ao padrão de desenvolvimento das mais avançadas seria questão de tempo e de administrar a terapia certa.
A história, de um lado, e o avanço do conhecimento, do outro, enfraqueceram o elegante arcabouço neoclássico. Não é possível atribuir à evolução material das sociedades humanas no tempo um comportamento regular e previsível.
O pressuposto que levaria ao máximo rendimento na economia –o indivíduo racional e plenamente informado em busca do interesse próprio– é muito raro nas condições reais, percebeu Ronald Coase (1910-2013) em seus trabalhos sobre o funcionamento das empresas.
Coase, Nobel de 1991, concluiu que há custos implícitos no comércio que se originam fora do ambiente de produção. Esses custos, denominados "de transação" ou externalidades, sempre dificultam a atividade econômica, num gradiente que pode inviabilizá-la.
Coube a Douglass North (1920-2015), Nobel de 1993, enfatizar a crítica mortal do insight de Coase ao pressuposto neoclássico e extrapolar esse achado para os campos da história econômica e do desenvolvimento comparado. Custos de transação são manifestações da eterna luta das comunidades humanas contra a ignorância, a incerteza e a opacidade do futuro.
Porque os homens estão imersos num labirinto de relações cujo mapa não enxergam, eles erguem arquiteturas diversas na tentativa de domar os monstros da incerteza e da violência, de regularizar na medida do possível o curso dos acontecimentos e de mitigar sua brutalidade potencial. As arquiteturas são as instituições: regras explícitas e tácitas de como o jogo social funciona, bem como os meios para sua efetivação. Tais regras se manifestam na economia sobretudo como custos de transação.
liberdade As instituições, continua Douglass North, limitam por definição a liberdade de escolha dos indivíduos. Elas podem fazê-lo de modo a favorecer mais ou menos a eficiência e a prosperidade de um povo. Evoluem e mudam com o tempo, mas não necessariamente para arranjos mais produtivos.
Apenas um minoritário conjunto de nações, nos 10 mil anos de história da civilização, logrou estabelecer, e muito recentemente, uma estrutura de estímulos flexível o suficiente para permitir uma moderada, mas constante e secular, evolução da prosperidade.
Essas são as "sociedades de acesso aberto", para usar o termo de North, ou as "inclusivas", na definição de Daron Acemoglu e James Robinson. Elas comungam entre si traços como o império abstrato da lei sobre todos, o livre acesso ao empreendedorismo, a proteção do direito à propriedade, a ampla participação política e democrática, a responsabilização de autoridades, o número elevado de organizações públicas e privadas e um volume relativamente alto de arrecadação e despesa governamentais, especialmente no nível subnacional.
A grande maioria das comunidades, entretanto, definiu arranjos que produzem grande variabilidade da renda no curto prazo, mas, quando muito, semiestagnação no decurso dos séculos. São os "Estados naturais", termo que North e colegas deslocaram do léxico hobbesiano, ou as "sociedades extrativistas" de Acemoglu e Robinson.
Nesses arranjos mais comuns, a incerteza e a violência são reduzidas por meio de um pacto restrito entre elites dominantes. A coalizão ela mesma está bastante vulnerável a choques internos e externos, o que açula a instabilidade.
Coase, North e outros desbravadores do campo nos últimos 20 anos, como a estrela de Harvard Dani Rodrik, restituíram um conjunto de disciplinas, das humanidades e das ciências mais duras, à base do conhecimento econômico ortodoxo, aquele discutido nas melhores escolas e nas principais publicações acadêmicas. Por essa via, uma nova teoria do desenvolvimento está em sedimentação.
Se faltava aplicar esse instrumental, de modo sistêmico, ao problemático desenvolvimento brasileiro, a lacuna acaba de ser preenchida com "Brazil in Transition: Beliefs, Leadership, and Institutional Change" [Princeton University Press, 280 págs., US$ 39,50, e-book Kindle, R$ 90,59] (Brasil em transição: crenças, liderança e mudança institucional), parceria entre o pesquisador americano Lee Alston (Universidade Indiana) e os professores brasileiros Marcus Melo (Universidade Federal de Pernambuco), Bernardo Mueller (Universidade de Brasília) e Carlos Pereira (FGV-RJ).
O primeiro choque ao atravessar o livro é entre a sua conclusão principal, de um lado, e o "timing" de seu lançamento, do outro. Foi pensado para abranger o período de meio século entre 1964 e 2014, foi finalizado em meados de 2015 e chega ao público no que parece ser o ponto mais baixo da pior crise econômica do Brasil como o conhecemos (urbano e populoso).
O contraste não poderia ser maior em relação à mensagem otimista do livro: a de que o Brasil iniciou, em meados dos anos 1990, uma transição decisiva para tornar-se nação desenvolvida, ou uma sociedade de acesso aberto.
Não bastasse a dificuldade de enfrentar a prova adversa da renda per capita –cuja evolução isoladamente não corrobora a tese–, os autores ainda terão de se deparar com o profundo pessimismo, com a dose cavalar de incertezas políticas e com o alargamento de horizontes para a recuperação que a derrocada econômica ajudou a produzir.
Para complicar, o pressuposto da narrativa é o de que o Brasil encontrou o seu caminho para a prosperidade quando a rede de forças políticas dominante, embalada pelo sentimento popular, chacoalhada por choques diversos e conduzida por lideranças algo visionárias, aderiu a um modelo de crenças calcado no amálgama entre inclusão social e responsabilidade fiscal. Aderiu e modificou as instituições nesse sentido.
A hipótese suporta bem a passagem dos anos Fernando Henrique Cardoso para o primeiro governo de Luiz Inácio Lula da Silva.
Se a ideologia do PT prenunciava tentativa de arrancar uma série de estacas que, sob Collor, Itamar e FHC, aprofundaram o controle da finança pública e a abertura da economia, nenhuma reviravolta ocorreu –seja porque os petistas não ousaram tanto, seja porque a reação social não permitiu.
Já a aspiração do partido de acelerar a inclusão social e a redução da pobreza pôde ser exercida com desenvoltura, pois se harmonizava com as crenças dominantes e com os estímulos por elas favorecidos.
A segunda administração Lula e, principalmente, a aventura Dilma Rousseff, balançam a confiança do leitor na higidez do argumento de "Brazil in Transition".
Como 20 anos de hegemonia da crença na inclusão social fiscalmente responsável e de enraizamento de suas balizas institucionais puderam abrir espaço para subversão tão vasta e desafiadora do modelo, no sentido do desenvolvimentismo inflacionário e predatório que os autores afirmam ter sido superado com o fim da ditadura, em meados dos anos 1980?
Há bons argumentos de defesa no livro. Uma parte está entrincheirada na ideia de que a trajetória de transição para um padrão mais aberto de sociedade é sempre acidentada e sujeita a reversões.
riscos O termo utilizado é "inclusão dissipativa" para descrever as brechas que o processo oferece a atores ainda bem posicionados em busca de proteção contra os riscos de empobrecimento e perda de poder implícitos na abertura.
Será, no entanto, que os custos de transação, para usar a linguagem de Ronald Coase, estariam superando os benefícios da inclusão no Brasil? Estaríamos mesmo diante de um caso de inclusão dissipativa? Ou, ao contrário, de dissipação inclusiva? Isso apenas com o tempo vai se esclarecer.
A resposta mais eficaz de "Brazil in Transition", porém, está na própria dieta da crise econômica e política. Se houve uma série de agravos contra os pilares do sistema de crenças e instituições dominante, houve reações igualmente duras desse arcabouço, no sentido de tentar restituir o jogo para dentro das fronteiras delimitadas.
A copiosa corrupção de colarinho branco e no empresariado conectado ao Estado produziu, como reação, o julgamento do Mensalão, o caso do Petrolão e seus filhotes. Todos vão pender como uma espada oculta sobre o mundo do poder durante décadas a fio.
A cavalgada populista e inflacionária de Dilma Rousseff, que rompeu os limites da responsabilidade fiscal e abusou da tolerância popular e social às mentiras de campanha, acabou punida com o impeachment. Que presidente vai se atrever a repetir a dose?
A inflexão desenvolvimentista já havia sido estancada e revertida, como tendência, antes mesmo da queda da presidente e por ela mesma, no seu curto segundo mandato. A correção de rota, para a retomada da abertura, acelerou-se com a equipe econômica nomeada por Michel Temer.
As conclusões do livro, como se nota, despertarão caloroso debate, mas a sua contribuição mais duradoura terá sido, sem dúvida, a de estabelecer o marco procedimental de uma nova teoria do desenvolvimento no e para o Brasil.
Dificilmente daqui em diante vai-se abordar esse tema, nas rodas mais sérias de debate e pesquisa, sem mencionar o papel crucial das crenças, das lideranças, das oportunidades (às vezes aleatoriamente oferecidas pela história, mas nem sempre aproveitadas), das expectativas frustradas ou satisfeitas sobre as ações e das regras do jogo, modeladas e remodeladas pelo entrechoque dos homens no ambiente opaco do tempo.
A história econômica e política do Brasil urbano, populoso e democrático passa a ter uma leitura e, sobretudo, uma maneira de leitura das mais fecundas.

terça-feira, 28 de junho de 2016

88- Explicando o Brexit

DINHEIRO NÃO EXPLICA TUDO, SENHORES

Por: Felipe Moura Brasil em Veja (24/06/2016)

Resumo, com base nos ensinamentos do filósofo inglês Roger Scruton, e comento abaixo os fatores que constituem as verdadeiras causas da insatisfação britânica com a UE:

A situação do pós-guerra 
Os britânicos defenderam com sucesso sua soberania contra o nazismo – e o país não foi ocupado. Outras nações, que mantiveram uma espécie de neutralidade, sofreram derrotas e/ou foram ocupadas. Isto implica uma enorme diferença na psique dos britânicos, porque eles saíram da guerra com o senso de ter cumprido um dever fundamental: o de proteger o país contra a ameaça externa. A premissa na cabeça deles é de que, ao defender sua liberdade, defendem também a Europa e seus valores contra as tentativas de destruí-los. Alemães e franceses, por exemplo, sobreviveram à ocupação e à animosidade entre eles e precisavam de um novo tipo de reconciliação que os britânicos dispensam. A geração que lutou contra Hitler deixou para as gerações seguintes uma pergunta incontornável a ser feita diante da opção de entregar a soberania a qualquer corpo político transnacional composto por burocratas não eleitos:
– Valeu a pena lutar para depois simplesmente se render?
Para se ter uma ideia do peso desta luta na história britânica, este blog recomenda o livro “O fator Churchill – Como um homem fez história”, escrito pelo ex-prefeito de Londres e também jornalista de carreira, Boris Johnson, um dos líderes do movimento pela saída da UE e, por isso mesmo, tachado de tudo quanto é rótulo negativo por jornalistas que nunca leram sua obra. Eis um trecho para facilitar:

“Um ano depois dessa decisão [de Winston Churchill] – lutar em vez de negociar [com Hitler] –30 mil homens, mulheres e crianças britânicos tinham perdido a vida, quase todos em mãos alemãs. Pesando na balança as alternativas – uma paz humilhante ou a matança de inocentes –, é difícil imaginar qualquer político britânico moderno tendo a coragem de seguir a mesma linha de ação de Churchill.”

No entanto, ele “estava disposto a pagar essa conta do açougueiro”, porque “tinha a vasta e quase temerária coragem moral de ver que seguir lutando seria pavoroso, mas que render-se seria ainda pior. Estava certo.”

Britânicos têm governo e leis diferentes em relação ao resto da Europa, que viveu a grande transformação infligida por Napoleão.
Na Grã-Bretanha, a legislação não foi em geral criada de cima, mas de baixo: da resolução dos conflitos entre pessoas comuns. O sistema de common law britânico têm especial dificuldade de se adequar a decisões de tribunais europeus. Quando os britânicos se veem submetidos a um regime de regulações bastante distinto daquele a que estão acostumados – no qual o Parlamento só intervém quando há algum problema adicional –, isto inevitavelmente gera sentimentos de revolta. A sensação é de estar sendo governado por gente de fora que não os entende e não sabe como resolver seus problemas, mas apenas criar regras, que geram tantos conflitos quanto resolvem – enquanto a common law só se ocupa de resolvê-los. Boris Johnson, agora cotado como favorito dentro do Partido Conservador para substituir David Cameron como primeiro-ministro, disse justamente o seguinte após a vitória do Brexit:

“Acredito que temos uma oportunidade gloriosa: podemos aprovar nossas leis e ajustar nossos impostos de acordo com a necessidade da economia do Reino Unido.”

O mais importante: britânicos falam a língua internacional e são tão imersos nela que raramente falam outra.
Têm em geral pouca habilidade para entender qualquer língua que não a sua; mas a língua que eles falam é a primeira que as demais pessoas geralmente aprendem. Então qualquer cidadão razoavelmente educado de outro país pode se mudar para o deles e se estabelecer no território; mas esse território é pequeno – e é muito amado também, porque os britânicos lutaram por ele em duas guerras mundiais. Esta era, de fato, a maior mensagem de propaganda naquele período: que eles tinham um lindo território que precisava ser salvo e protegido. Então os britânicos se sentem sob cerco em função da provisão de liberdade de movimento concedida pela União Europeia, que leva meio milhão de pessoas a cada ano para dentro do pequeno país. Como esta provisão está embutida no acordo, é quase impossível de mudar. E ela é o fator mais incômodo aos britânicos, que sentem terem perdido o controle sobre suas fronteiras. Um vasto número de pessoas dos países que eram comunistas no Leste Europeu competem com eles por trabalho e sobretudo moradia, o que causa uma enorme crise imobiliária que os britânicos não sabem como resolver. Isto remete à primeira razão, de defesa da soberania. Britânicos se perguntam como pode haver soberania nacional se eles perderam o direito de controle das fronteiras: se não podemos excluir aqueles que não queremos e se temos de dar privilégios especiais àqueles que queremos. Esses 3 fatores, amparados num senso profundo de ordenamento político que vigora há mil anos, são as verdadeiras causas da insatisfação britânica com a UE.

DUAS OBSERVAÇÕES BÁSICAS:

1) A UE, em seu entusiasmo por dissolver as fronteiras, deixou-se desprotegida contra migrações de massa.

O sentimento alemão de culpa obviamente piora a situação e não há como negar a preocupação com os problemas criados pelas medidas politicamente corretas adotadas por Angela Merkel.
Esta preocupação se traduz nas seguintes questões:

a) Não há limites para as pessoas que receberemos e, se houver, somos forçados a aceitar uma transferência completa de população ao nosso país que lutou para se proteger precisamente contra as ambições de seus vizinhos?

b) Devemos ignorar fatores como conhecimento, religião, capacidade de adaptação e cultura na incorporação de novas comunidades em nosso meio?

Essas são as grandes perguntas que a UE despertou e que, até certo ponto, proibiu a população dos países-membros de discutir. Escócia e Irlanda do Norte votaram por permanecer no bloco e políticos dos dois países já sinalizaram que pretendem trabalhar por um referendo para se separarem do Reino Unido, mas os britânicos estão dispostos a aceitar as consequências.

2) Ser governado por um tratado é colocar-se numa situação em que você não pode se adaptar à mudança.

Cada nação pode identificar seus problemas e resolvê-los ou adaptar-se a eles se puder tomar iniciativas legislativas por si própria. Se não podem tomar decisões, como vão se adaptar? O acordo impõe que se tenha a assinatura de todos os seus membros para fazer mudanças até as mais básicas. Mas é um acordo assinado há mais de 50 anos por pessoas que já morreram em uma situação que já desapareceu. Então se questiona:

– Por que ainda devemos ser governados por isso em vez de nossas próprias decisões serem tomadas em nossos parlamentos de acordo com o nosso próprio senso de quais são os nossos problemas?

A maioria dos britânicos considera irracional essa submissão. Quando Lenin impôs o comunismo naquilo que se tornou a URSS, ele destruiu todas as instituições nas quais a oposição poderia se formar. Não apenas as instituições do Parlamento, mas também as instituições jurídicas, abolindo os tribunais e as profissões adjacentes. Então não havia oposição e a URSS seguiu assim por 70 anos até a queda do muro que nunca deveria ter estado lá. Construir um ordenamento político sem espaço para oposição ou sem a habilidade de mudar de acordo com a necessidade do momento é o maior dos erros políticos. É o erro de criar uma ordem política que não vai reconhecer erros políticos. É isto que a UE fez, na prática, ao vincular todos os seus procedimentos a um acordo assinado em uma situação que desapareceu. A UE confiscou a soberania nacional e não ofereceu nada em troca por ela.

DUAS RESPOSTAS A ARGUMENTOS ECONÔMICOS:

1) Os argumentos econômicos não tendem a uma só direção

Uma zona de livre comércio obviamente simplifica o comércio e portando a prosperidade, mas as regulações do regime da UE ao mesmo tempo criam obstáculos contra isto, dando um limite de competitividade a países do Círculo do Pacífico e controlando as horas de jornada e condições de trabalho, o que torna nações da UE não competitivas na moderna economia global.
Esses problemas são complexos, mas as evidências históricas mostram que os economistas são muitas vezes autoridades autocentradas que erram com frequência em seus julgamentos (especialmente quando estão em jogo elementos para além de sua especialidade, o que praticamente sempre é o caso, pois o mundo real não vem separado em categorias). A UE não ensinou o Reino Unido a fazer comércio, muito pelo contrário. E se o país souber fortalecer seu capital cultural, tende a reverter efeitos negativos imediatos da economia com muito mais consistência em longo prazo, como aconteceu com todas as nações que historicamente colocaram a conquista da inteligência e da liberdade à frente da ambição financeira.

2) O argumento não é sobre economia, de qualquer modo. É sobre identidade: quem somos nós?

Imagine persuadir pessoas a compartilhar suas casas e terras com uma família cujos modos e valores elas não podem aceitar, sob a contrapartida de que ficarão duas vezes mais ricas do que são. A resposta poderia ser: ok, que bom que seremos duas vezes mais ricos, mas não teríamos o que realmente queremos, que é o nosso amor um pelo outro, nosso vínculo a este lugar e nossa habilidade de governarmos a nós mesmos de acordo com o nosso próprio modo de vida. Esta resposta soa perfeitamente razoável. Uma das grandes perguntas neste debate é: não há outros valores que não os econômicos? No nosso mundo, quando políticos têm de responder perguntas, eles rebaixam as perguntas aos termos econômicos: será melhor se fizermos isto, será pior se fizermos aquilo, e assim por diante, mesmo quando as perguntas sobre economia vêm apenas depois de perguntas sobre integridade, soberania e liberdade. E é disto que se trata.

MARGARET THATCHER AVISOU. ELA TINHA RAZÃO.

Em entrevista à revista Forbes, publicada em 26 de outubro de 1992, a ex-premiê britânica afirmou:

“As nações se sentem confortáveis em sua própria nacionalidade. O orgulho permite que você faça coisas que de outra forma poderia não ser capaz de fazer. A Europa deve se constituir de cada grupo em sua própria identidade nacional. Não tente apagar isso. Se você tentar empurrar as pessoas para um molde, você vai criar ressentimento, e é isto que você está criando agora. (…) Maastricht foi um acordo que virou totalmente na direção errada. Foi um tratado que nos levou de ser uma comunidade econômica com uma espécie de mercado comum como nosso objetivo, a tentar criar uma União Europeia com uma cidadania dessa união”.

O temor de Thatcher: “80% das decisões econômicas da Grã-Bretanha será feita em Bruxelas.”

“O que é que há com essas pessoas que gostam das liberdades da democracia, que apreciam que os representantes eleitos prestem contas perante o povo? Por que eles querem substituir isto por burocracia? Qual é o problema, o que aconteceu com eles? Vou lhe dizer que a Comissão [Europeia] ama seus poderes. Poder por uma questão de poder. Não foi por isso que lutamos. Nós lutamos pela democracia, liberdade e Justiça. (…) Nós acabamos de reeleger nosso parlamento. Para quê? Apenas para ser um talk show?”

Sistemas internacionais centralizados, como moedas nacionais, estavam fadadas ao fracasso segundo Thatcher porque “estamos todos em diferentes níveis de desenvolvimento das nossas economias”. Ela alertou para “enormes subsídios extras do resto de nós para eles ou movimentos maciços de imigração de seus países para o nosso. Ambos causariam ressentimento e não um desenvolvimento harmonioso. Devemos cada um de nós se orgulhar de ser países separados que cooperam juntos”. De fato, os europeus se livraram de moedas nacionais e as substituíram pelo euro, mas as economias combinadas eram totalmente distintas.Thatcher ensinava ainda:

“A forma regular mais detalhada de cooperação internacional é o comércio, o comércio internacional. Ele acontece a cada hora do dia. As grandes empresas em países pequenos que vendem para pequenas empresas em grandes países. Não importa o tamanho do seu país. Em livre comércio, você obtém a livre circulação com os melhores produtos, o melhor valor para o consumidor. E é isso que todos nós devemos levar adiante. Não blocos de comércio que excluem as pessoas.”

Sendo ou não bravata da Dama de Ferro, em tudo isto que previu, em tudo que falou em 1992 que daria errado com a permanência no bloco, ela estava coberta de razão, embora o atual CEO esquerdista da própria Forbes não tenha aprendido bulhufas:

As elites políticas e econômicas da UE, como o resto do establishment bancado e pautado por toda parte pelo investidor bilionário de esquerda George Soros, não estão interessadas no povo britânico, mas, sim, em manter seu poder e, quem sabe, aumentá-lo, rotulando de populistas de direita quem lhes faça oposição e de idiotas quem os siga. Felizmente, dessa vez, os britânicos ouviram Thatcher e escaparam do engodo. Agora, como antecipei em abril, só falta o Brasil se livrar de Mercosul e Unasul: